Incompletude e a imperfeição da matemática...

Olá leitor.

Para aqueles que querem entender melhor o teorema da Incompletude de Gödel, vejam o capítulo 30 do livro do Marcelo Gleiser "A Ilha do Conhecimento" (ISBN 9788501063045):



30 Incompletude

(Onde exploramos brevemente as incríveis ideias de Kurt Gödel e Alan Turing)

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De forma surpreendente e brilhante, o austríaco Kurt Gödel trouxe o elemento humano à matemática. Em 1930, com apenas 23 anos, o enigmático especialista em lógica provou dois teoremas que demonstraram, em essência, que a matemática ou, mais precisamente, qualquer sistema formal adequado para aplicações na teoria dos números não era autônomo, necessariamente incluindo uma asserção que não pode ser provada e cuja negativa também não pode ser provada. Como corolário (seu segundo teorema), Gödel mostrou que a própria consistência de um sistema formal não pode se provada usando as regras do próprio sistema. Em outras palavras, o sonho de se construir a matemática como um sistema lógico completo e autônomo, dividido por alguns dos maiores matemáticos de todos os tempos, foi sumariamente destruído. Mesmo que fosse sempre possível suplementar o sistema incompleto com axiomas adicionais de modo a obter sua consistência, como foi feito em vários casos, a incompletude não podia ser driblada. Os resultados de Gödel danificaram irremediavelmente a aura de perfeição e beleza que havia inspirado as várias manifestações do idealismo platônico durante milhares de anos. A represa talvez não houvesse cedido por completo, mas as rachaduras estavam expostas para quem quisesse vê-las.
O alvo principal de Gödel foi a obra monumental de Bertrand Russell e Alfred North Whitehead, o Principia Mathematica, produzida entre 1910 e 1913, na qual os autores tentaram construir toda a matemática a partir de algumas regras básicas da lógica. O projeto era a encarnação mais perfeita do racionalismo. Seu objetivo era mostrar que a manipulação de certos símbolos, dotados de regras preestabelecidas, poderia recriar o pensamento matemático por inteiro. Gödel trocou símbolos por números, mostrando que os padrões simbólicos do Principia podiam ser representados por padrões numéricos, como cálculos envolvendo números. Como o trabalho de Russell e Whitehead era autorreferencial (fechado sobre si mesmo como a mítica serpente Ouroboros, que engole seu próprio rabo), Gödel mostrou que o projeto sofria do mesmo problema explorado em antigos paradoxos da lógica, como o famoso paradoxo do mentiroso: “Essa asserção é falsa.”
Vemos logo que esse tipo de paradoxo em lógica cria uma espécie de beco sem saída: por um lado, a asserção não pode ser verdadeira, pois, caso seja, afirma que é falsa; e, por outro, também não pode ser falsa, pois, caso seja, afirma a verdade. Gödel mostrou que era possível escrever uma fórmula usando as premissas do Principia que era autocontraditória: “Essa fórmula não pode ser provada usando as regras estabelecidas no Principia Mathematica.” Posso imaginar o desapontamento de Russell e Whitehead, cuja intenção era justamente livrar a matemática desse tipo de ciclo vicioso. Como escreveu Hofstadter, “Com tremenda ousadia, Gödel invadiu a fortaleza do Principia Mathematica, deixando-a em ruínas”.
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