UM POEMA DE VOLTAIRE
Voltaire não estava satisfeito com a resposta de Spinoza, de que bem e mal são termos humanos, inaplicáveis ao universo, e que nossas tragédias são coisas triviais na perspectiva da eternidade.
Eis o poema do filósofo Voltaire:
Sou ínfima parte do grande todo.
Sim; mas todos os animais condenados a viver,
Todas as coisas sensíveis, nascidos segundo a mesma lei implacável,
Sofrem como eu, e como eu também morrem.
O abutre aperta sua tímida presa,
E golpeia com o sanguinário bico os trêmulos membros:
Para ele, parece, está tudo bem. Mas pouco depois
Uma águia faz o abutre em pedaços;
A águia é trespassada por setas do homem;
O homem, caído na poeira dos campos de batalha.
Misturando seu sangue com companheiros agonizantes,
Torna-se, por sua vez, o alimento de pássaros vorazes.
Assim o mundo todo geme em cada membro,
Todos nascidos para o tormento e para a morte mútua.
E sobre esse horrendo caos, você diria
Que os males de cada um formam o bem de todos!
Que bem-aventurança! E quando, com voz trêmula,
Mortal e lamentavelmente você grita "Tudo bem",
O universo o desmente, e seu coração
Refuta cem vezes a sua presunção. (...)
Qual é o veredicto da mente mais ampla?
Silêncio: o livro do destino está fechado para nós.
O homem é um estranho para com a sua própria pesquisa;
Não sabe de onde vem, nem para onde vai.
Átomos atormentados num leito de lama,
Devorados pela morte, um escárnio do destino;
Mas átomos pensantes, cujos olhos que enxergam longe,
Guiados por pensamentos, mediram as fracas estrelas.
Nosso ser mistura-se ao infinito;
A nós mesmos, nunca vemos ou chegamos a conhecer.
Este mundo, este palco de orgulho e do errado,
Está cheio de tolos doentes que falam em felicidade. (...)
Certa vez cantei, em tom menos lúgubre,
Os belos caminhos da regra geral do prazer;
Os tempos mudaram e, ensinando pela idade que avança,
E participando da fragilidade da humanidade,
Buscando uma luz em meio à crescente escuridão,
Só me resta sofrer, e não irei reclamar.
Fonte: Selected Works of Voltaire; Londres, 1911; pp. 3-5.
Eis o poema do filósofo Voltaire:
Sou ínfima parte do grande todo.
Sim; mas todos os animais condenados a viver,
Todas as coisas sensíveis, nascidos segundo a mesma lei implacável,
Sofrem como eu, e como eu também morrem.
O abutre aperta sua tímida presa,
E golpeia com o sanguinário bico os trêmulos membros:
Para ele, parece, está tudo bem. Mas pouco depois
Uma águia faz o abutre em pedaços;
A águia é trespassada por setas do homem;
O homem, caído na poeira dos campos de batalha.
Misturando seu sangue com companheiros agonizantes,
Torna-se, por sua vez, o alimento de pássaros vorazes.
Assim o mundo todo geme em cada membro,
Todos nascidos para o tormento e para a morte mútua.
E sobre esse horrendo caos, você diria
Que os males de cada um formam o bem de todos!
Que bem-aventurança! E quando, com voz trêmula,
Mortal e lamentavelmente você grita "Tudo bem",
O universo o desmente, e seu coração
Refuta cem vezes a sua presunção. (...)
Qual é o veredicto da mente mais ampla?
Silêncio: o livro do destino está fechado para nós.
O homem é um estranho para com a sua própria pesquisa;
Não sabe de onde vem, nem para onde vai.
Átomos atormentados num leito de lama,
Devorados pela morte, um escárnio do destino;
Mas átomos pensantes, cujos olhos que enxergam longe,
Guiados por pensamentos, mediram as fracas estrelas.
Nosso ser mistura-se ao infinito;
A nós mesmos, nunca vemos ou chegamos a conhecer.
Este mundo, este palco de orgulho e do errado,
Está cheio de tolos doentes que falam em felicidade. (...)
Certa vez cantei, em tom menos lúgubre,
Os belos caminhos da regra geral do prazer;
Os tempos mudaram e, ensinando pela idade que avança,
E participando da fragilidade da humanidade,
Buscando uma luz em meio à crescente escuridão,
Só me resta sofrer, e não irei reclamar.
Fonte: Selected Works of Voltaire; Londres, 1911; pp. 3-5.